terça-feira, 11 de agosto de 2020

Recomeçar a batalha contra a privatização do saneamento

José Faggian – Presidente do Sintaema

Quem diria, sete meses atrás, que a humanidade estaria passando pela crise sanitária que enfrenta hoje. A crise do novo coronavírus atinge dimensões globais e impõe a praticamente todos os países do mundo quarentenas que reduzem o consumo, a produção e o comércio causando estragos até para as economias mais sólidas ao redor do planeta. 

 

Nós, que aqui no Brasil já vínhamos “mais pra lá do que pra cá”, mergulhamos em um poço que, ao que tudo indica, levaremos décadas para sair, principalmente pela postura negacionista do governo central e a relutância em se tomar as medidas necessárias para se combater a pandemia, que, diga-se de passagem, até agora ainda não estão adequadas.

A crise sanitária expôs, de forma cristalina, a importância do papel do Estado e dos serviços públicos serem públicos e universais, serviços como saúde, por exemplo, e outros a ele transversais.

O mesmo governo que não criou um plano concreto e articulado para combater a pandemia, tocou a todo vapor o projeto, que é o motivo principal para o qual foi eleito, de entregar as riquezas nacionais ao capital, principalmente ao estrangeiro.

Ou, como melhor explicou um ministro, velho conhecido nosso, aproveitaram-se de que ninguém estava olhando, já que todos estavam preocupados com a covid, e estralaram o chicote para que a boiada passasse mais rápido. Por essa mesma porteira querem que passe o saneamento.

Desde 2018 as forças e parlamentares progressistas, o movimento social organizado e o movimento sindical, principalmente o ligado ao setor, com destaque ao Sintaema, a Fenatema e a FNU, vêm travando uma luta de Davi contra Golias para impedir que as mudanças no marco regulatório fossem aprovadas, mudanças essas que têm o claro objetivo de facilitar que o setor privado abocanhe a fatia lucrativa do saneamento, que no Brasil representa algo em torno de 10% dos municípios apenas.

Durante essa batalha, que envolveu grandes mobilizações nacionais, e grandes protestos dos trabalhadores, inclusive na Sabesp, puxados por nós e de maneira unificada com toda a comunidade interna da empresa, derrotamos grandes interesses de multinacionais que foram representados em duas medidas provisórias, a 844 e a 868 e conseguimos dar muito trabalho dificultando a aprovação do PL 4162.

A luta foi tão intensa a ponto de o senador Tasso Jereissati, o senador “coca-cola”, relator do projeto no senado, declarar que “estava sendo mais difícil aprovar a lei do saneamento do que a reforma da previdência.”

Resistimos bravamente, mas, a despeito dos nossos esforços, no dia 24 de junho as modificações no marco regulatório do saneamento foram aprovadas. Imediatamente o discurso das empresas “interessadas” em investir no saneamento, que até então era de que o setor privado iria investir para universalizar os serviços, mudou.

E no dia seguinte, os jornais da grande mídia estamparam as reais intenções dessas empresas: “investir apenas nos grandes centros e regiões metropolitanas onde o retorno é rápido e garantido”.

Como desde o começo vínhamos denunciando, a iniciativa privada quer apenas o “filet mignon”, portanto, a nova lei, que ao ser sancionada sofreu vetos que a deixaram ainda pior do que no texto aprovado, coloca em risco não apenas as empresas estaduais sólidas e constituídas, mas também todo o atual sistema de saneamento que hoje está em funcionamento, além de não entregar o que promete, os investimentos onde realmente são necessários para a universalização do saneamento no Brasil.

A derrota foi dura, derrota essa que não se restringe aos trabalhadores do setor, mas que se estende a todo povo brasileiro, à população que não tem saneamento e que vai continuar não tendo, e a que tem verá piorar a qualidade dos serviços e aumentar o preço das tarifas.

Porém, a guerra ainda não está perdida, inauguramos uma nova fase da luta. A partir de agora o embate se desloca da esfera nacional para a esfera local, temos que convencer os prefeitos e vereadores de todas as cidades do Brasil de quão nocivo esse novo marco regulatório é ao saneamento e à população, e para isso faremos grandes campanhas.

Começa também a batalha no campo jurídico, já que a nova lei está repleta de inconstitucionalidades, e vamos, portanto, promover uma série de Adin’s – Ações Diretas de Inconstitucionalidade de forma articulada por meio das nossas federações e confederações, além de mantermos forte nossa articulação no congresso nacional junto aos parlamentares que nos apoiam.

A luta está apenas começando, ainda que em um novo estágio!



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