terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

UNIDADES PRISIONAIS E A POPULAÇÃO TRANS



Ítalo Mantovani*
No data em que se celebrou o dia da visibilidade trans (29/01), a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) lançou um documento inédito sobre o número de pessoas transgêneros que estão nos presídios do estado de São Paulo. A população LGBTI+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Mulheres Transexuais, Homens Trans, Intersexos e Mais) foi quantificada por autodeclaração e contou com um cartão para poder se reconhecer ou apontar outra identidade diversa.
Os dados foram obtidos em outubro de 2019 por meio de uma planilha elaborada especialmente para a coleta. O formulário continha explicações a respeito da diversidade sexual e de gênero e ainda a forma como seria realizada a pesquisa. Participaram todas as 175 unidades prisionais existentes à época no Estado de São Paulo em um universo de 232.979 reeducandos. As pessoas trans também foram consultadas sobre quais unidades gostariam de estar: masculinas ou femininas. A Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) deixou claro em sua pesquisa que as definições utilizadas em Diversidade Sexual e de Gênero se baseiam na cartilha: "Diversidade Sexual e a Cidadania LGBT" da Coordenação de Políticas para a Diversidade Sexual da Secretaria da Justiça e Cidadania e nos apontamentos de movimentos sociais.
Os questionários foram preenchidos por um servidor da secretaria, acompanhado da pessoa questionada, sendo que a própria pessoa que se identificava como pertencente a determinado gênero ou sexualidade. Quando havia dúvidas, os agentes penitenciários mostravam um gráfico que explica cada identidade/ sexualidade. Os servidores foram treinados para explicar, em linguagem acessível, cada uma das diferenças. O levantamento será importante na formulação de campanhas destinadas à defesa dos direitos desse público.
 O levantamento, realizado em outubro do ano passado, apontou que, das então 232.979 pessoas custodiadas na SAP naquele período, 869 se declararam mulheres trans ou homens trans. Ao todo, eram 5.680 presos (as) LGBTQI+ na Pasta, que correspondem a 2,44% da população total. A pesquisa também aponta que a maioria das pessoas que se declaram travestis e mulheres trans preferem ficar na unidade em unidades masculinas: das 682 que preencheram esse item no questionário, 535 (78,44%) expressaram essa preferência. Entre os homens trans, 82,35% dos que responderam ao questionamento (51) declararam-se a favor de permanecer em unidades femininas.
O relatório deixou claro que em todas as unidades femininas há presença de mulheres lésbicas, bissexuais e homens trans de forma dispersa. Nas unidades masculinas, também existe a presença dispersa de homens gays, bissexuais, travestis e mulheres transexuais, mas há concentração dessa população, especialmente pessoas trans, em algumas unidades. Pessoas intersexuais e assexuais estão tanto em unidades masculinas como em femininas.
Dos 5.680 presos (as) declarados (as) LGBTI+, a distribuição ficou com 239 mulheres declaradas transexuais (pessoas que apresentam uma identidade de gênero feminina diferente daquela atribuída no nascimento – masculina), correspondendo a 4,2%. Lésbicas (pessoas que se relacionam afetivo sexualmente com o mesmo sexo e/ou gênero feminino) teve 1.375 pessoas que se declararam, ou seja, 24,2%. Intrasexuais (pessoas que nasceram biologicamente entre o sexo masculino e feminino, mas que podem apresentar identidade de gênero divergente da atribuída na infância, geralmente escolhida pela família e profissionais da saúde) e Assexuais (pessoas que manifestam pouco ou nenhum interesse em atividades sexuais, podendo manter relações afetivas com seus pares) foram respectivamente 5 e 7 pessoas, isto corresponde em porcentagem a aproximadamente 0,1% para ambos. Gays (pessoas que se relacionam afetivo sexualmente com o mesmo sexo e/ou gênero masculino) foram registrados pelos questionários 953 reeducandos, que corresponde a 14,5%. Bissexuais (pessoas que se relacionam afetivo sexualmente com ambos os sexos/gêneros), corresponde a 2.471 detentos, ou 38% da população LGBTI+.
A SAP vem investindo na reintegração social da população LGBTI+ por meio de capacitação voltados a essa população específica. Além do Diversidade à Mesa, que treina reeducandas trans e gays como auxiliares de cozinha, também é oferecido pela Pasta o Beleza no Cárcere, que se destina ao mesmo público, porém, é focado em formar maquiadores profissionais. Os funcionários, por sua vez, recebem capacitação sobre a importância da diversidade – só em 2019 foram 831 servidores capacitados sobre o tema por meio da Escola de Administração Penitenciária. Sem falar que a população trans sob custódia tem seus direitos reconhecidos por meio de resoluções como a SAP 11 de 30 de janeiro de 2014, que garante corte de cabelo e de roupa íntima de acordo com a identidade de gênero, uso de nome social em documentos e, quando requisitado pelos próprios interessados, cela ou ala específica para os (as) presos (as) transexuais nos presídios, de forma a garantir sua dignidade, individualidade e adequado alojamento.


v      Assessor de Gabinete na Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo
Formado em Gestão de Políticas Públicas pela USP
Mestrando em Gestão e Desenvolvimento Regional
Professor de Cursinho pré-vestibular em São Paulo
Contato: italocmantovani@gmail.com


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