sexta-feira, 24 de novembro de 2023

Pinda: escândalo milionário na saúde relacionado à Covid

 



    R$ 1,9 milhão é o valor do contrato com dispensa de licitação

Marcos Limão | Data: 23/11/2023 13:45

A contratação com dispensa de licitação do Instituto Esperança pela Prefeitura de Pindamonhangaba para a gestão, operacionalização e execução dos serviços de saúde relacionados à Pandemia do Covid-19 resultou na ação por improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público de SP contra o prefeito Isael Domingues, a secretária de saúde Valéria dos Santos, o Instituto Esperança e seu representante legal, o militar reformado Pedro Cipriano da Silva Júnior.

O contrato denunciado alcançou a cifra de R$ 1,9 milhão e a denúncia do MP cita “contratação direcionada”, além de outras irregularidades graves, como a inexecução do contrato, o caráter genérico do termo de referência, a forma de ajuste da contratação não condizente com a boa governança e ausência de idoneidade nos acréscimos realizados ao contrato inicial. 

O Ministério Público almeja a condenação dos denunciados por improbidade administrativa, ressarcimento aos cofres públicos, pagamento de multa civil, pagamento de dano moral coletivo e a proibição de contratar com o poder público, cuja sanção atinge em cheio o Instituto Esperança, organização social que, ao longo dos últimos anos, semeou diversas relações políticas e conquistou contratos milionários com prefeituras da região.

TERMO DE REFERÊNCIA

Termo de Referência pode ser entendido como o documento em que a Administração Pública fornece detalhes das necessidades, para instruir o procedimento que resultará na contratação do serviço. 

Inobstante se tratar de um contrato milionário para serviços de saúde relacionados à Pandemia do Covid-19, o Termo de Referência da Prefeitura de Pindamonhangaba apresentou “elevada subjetividade” e deixou de detalhar informações imprescindíveis, como a quantidade de leitos que seriam oferecidos aos pacientes pelo hospital de campanha, afetando negativamente a possibilidade de aferição dos valores praticados no mercado.

O mais curioso é que foi justamente o caráter genérico do Termo de Referência que fez a Prefeitura de Pindamonhangaba produzir prova contra si mesma.

Isso porque a quantidade exata de leitos - que deveria constar no Termo de Referência - somente foi informada quando o Tribunal de Contas do Estado (TCE) solicitou a informação durante a análise do contrato. E, de acordo com as informações prestadas pela Prefeitura, o contrato foi assinado no dia 07/04/2020, com início da execução em 01/05/202, para a oferta de 40 leitos em até 90 dias.

Acontece que, ao responder um outro questionário do TCE, desta vez sobre a Gestão de Enfrentamento do Covid-19, em momento posterior, a própria Prefeitura informou que o município dispunha de apenas 26 leitos no dia 31/07/2020.

“A irregularidade com a não oferta do objeto contratado em tempo adequado é patente. A contratação direta que teve por mote a urgência, relacionada à Covid-19, justificadora da dispensa de licitação, não foi cumprida com igual urgência”, sustenta o MP na ação.

DESAJUSTE NA FORMA DE CONTRATAÇÃO

O Ministério Público contesta o modelo de contratação, sustentando que a Prefeitura de Pindamonhangaba deveria ter firmado um “convênio” e não um “contrato administrativo” em contratação direta (com dispensa de licitação).

De acordo com o MP, a consequência mais danosa foi a dificuldade de o órgão de controle, no caso, o Tribunal de Contas do Estado, de proceder à fiscalização do contrato administrativo, bem diferente se se tratasse de um convênio, que poderia ser acompanhada mais de perto.

Aqui, mais um escândalo envolvendo a contratação: inconsistência nas datas da montagem do processo administrativo que resultou na contratação direcionada, segundo a denúncia, do Instituto Esperança.

Embora o processo administrativo para a contratação direta do Instituto Esperança  tenha iniciado no dia 31/03/2020, consta dos autos que a justificativa apresentada pela Prefeitura de Pindamonhangaba data de 23/03/2020, ou seja, antes mesmo de o processo existir, o Executivo municipal produziu documento afirmando que “A escolha da empresa INSTITUTO ESPERANÇA – IESP foi feita devido ser a única empresa a fornecer orçamento e que tem capacidade de atender o termo de referência em tempo hábil. Foram consultados hospitais dentro do município, onde se fosse possível a realização do serviço, porém foram retornados negativos devido à alta demanda. Considerando que não podemos tornar o processo moroso devido à gravidade da situação que se avizinha, onde o trabalho de prevenção é essencial para combater a pandemia de COVID-19, optamos pelo envio dos documentos da referida empresa”, sendo que tal procedimento não precedeu de pesquisas de preços efetivas e em quantidades consideráveis com os concorrentes o instituto determinando o porquê da escolha da referida associação privada para fins de prestação do objeto que viria a ser contratado. 

Além disso, o Instituto Esperança modificou o valor do serviço em três oportunidades: começou com R$ 352.224,77 por mês, depois passou para R$ 778.064,85 por mês para, ao final, determinar o valor de R$ 651.287,95 por mês, sem aparente justificação para as alterações.

O Ministério Público asseverou na denúncia que "todas as ditas modificações foram injustificadas, porém aceitas, sem maiores esclarecimentos e fundamentações, pela Administração Pública municipal, o que já se apresentaria como indícios suficientes de irregularidade, mas não é só!”.

Isso porque a Prefeitura de Pindamonhangaba tinha dito ao Tribunal de Contas do Estado que somente o Instituto Esperança tinha apresentado proposta de preço para execução do serviço, contudo, os autos do processo administrativo demonstram que outra empresa - nome fantasia “Max Emergências Médicas” - também havia ofertado proposta no dia 30/03/2023 com valores menores aos cobrados pelo Instituto Esperança. 

Além disso, houve rasura na proposta da empresa “Max Emergências Médicas” para alterar a apresentação da proposta para data futura, para 06/04/2020, concidentemente, no mesmo dia em que o Instituto Esperança encaminhou documento suplementar baixando o serviço para o cisto de R$ 651.287,98 por mês, o que permitiu a contratação.

TERMOS DE ADITIVOS

Os aditivos são acréscimos ao contrato inicialmente entabulado entre as partes.

Além de os termos de aditivos estarem comprometidos pelo princípio da acessoriedade, pois o contrato ilegal resulta em aditivos igualmente ilegais, os Termos de Aditivos, de acordo com o Ministério Público, “também não contaram com justificativas aceitáveis, sobretudo aquelas relacionadas ao quantitativo de leitos efetivamente disponibilizados, assim como a compatibilidade dos preços contratados com os praticados no mercado à época, pelo que se deixou de comprovar, por consequência, a vantajosidade das prorrogações contratuais”.

Os aditivos geraram aumento do custo de R$ 87.710,40 por três meses consecutivos (aumento total de R$ 263.131,20), sem a demonstração de estudos preliminares ou qualquer demonstração real da necessidade do acréscimo. Pior. O pagamento a mais ocorreu por 03 meses no momento em que haviam somente mais 02 meses de prestação de serviço pelo Instituto Esperança.

DEFESA Ctrl C + Ctrl V

Os acusados foram citados e apresentaram as suas respectivas defesas no processo. Chama a atenção o fato de que as contestações, em que pese terem sido redigidas e assinadas por advogados diversos, apresentarem trechos idênticos, com cópia ipsis litteris (pelas mesmas letras), nas discussões das teses mais sensíveis ao caso, o que envolve as defesas dos agentes políticos e da associação privada.

OUTRO LADO

Tanto a Prefeitura de Pindamonhangaba quanto o Instituto Esperança foram procurados pela reportagem, mas não enviaram manifestação até a conclusão da reportagem. 

Entre os questionamentos enviados para o Executivo municipal, foi perguntado se a Prefeitura de Pindamonhangaba instaurou algum procedimento interno para apurar os fatos narrados pelo MP na ação judicial e se as contratações dos advogados ocorreram às expensas de cada acusado, ou não. 


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