Ítalo do Couto Mantovani*
Em um intervalo de apenas 16 dias, quatro agentes da Polícia
Militar foram mortos a tiros em cidades de São Paulo, três deles de folga
(sendo um deles da reserva) e um em serviço. O número já supera todos os
registros oficiais do tipo contabilizados no primeiro trimestre do ano passado,
além de corresponder a um quinto dos 20 óbitos de PMs registrados ao longo de
2023 (só de agentes da ativa), segundo dados da Secretaria da Segurança Pública
(SSP).
Os resultados de investigações até agora não apontam ligação
entre os casos, mas as mortes em sequência ligam sinal de alerta. A Secretaria
da Segurança Pública diz que os casos não refletem, necessariamente, uma
tendência. Afirma também que reforça ações para proteger os agentes. Para
especialistas, é precipitado afirmar que se trata de ofensiva do crime
organizado, mas chama a atenção o fato de dois dos óbitos terem sido na Baixada
Santista, área de presença de facções ligadas ao tráfico e palco de operações
policiais recentes. As tropas trabalham sob alto índice de pressão, muitas
vezes com reflexos graves na saúde mental dos agentes. A perda de colegas
aumenta a sensação de risco e torna o ambiente de trabalho mais tenso. Os
especialistas, porém, alertam que as mortes não devem ensejar “operações
vingança”, que são caracterizadas por incursões letais de policiais em
comunidades onde afirmam haver suspeitos dos assassinatos. Os argumentos são de
que, além de desrespeitar o direito de defesa dos suspeitos e colocar inocentes
em perigo, ações do tipo oferecem risco para os próprios policiais.
As duas primeiras mortes, ambas de policiais de folga na zona
sul da capital paulista, foram após tentativas de assalto em 18 de janeiro. No
dia 26, um agente foi baleado e morto quando transitava de moto na Rodovia dos
Imigrantes, na altura de Cubatão. Já na sexta-feira, 2, um soldado das Rondas
Ostensivas Tobias Aguiar (Rota) foi morto em Santos durante ação de
patrulhamento. Dados da secretaria apontam que, embora tenham tido queda de
6,2% entre 2022 e o ano passado, os roubos seguem em patamar elevado: foram
228.028 casos em 2023, o equivalente a 624 crimes dessa natureza por dia. Ao
todo, 167 pessoas foram vítimas de latrocínio no período. Este alto índice de
roubos em São Paulo abre caminhos para latrocínios, que é o Roubo seguido de
morte.
Em resposta aos quatro assassinatos no começo do ano, a gestão
Tarcísio de Freitas (Republicanos) deflagrou novas fases da Operação Escudo em
todas as regiões onde os policiais foram mortos. Na última delas, iniciada após
a morte do soldado da Rota em Santos, houve sete mortos pela PM. Segundo a
Secretaria da Segurança, todos os casos envolveram confronto. Vale lembrar que
a Operação Escudo começou em julho do ano passado, a morte do soldado da Rota
Patrick Bastos Reis no Guarujá, também na Baixada, levou à deflagração da 1ª
fase da Operação Escudo, que durou 40 dias e terminou com 28 mortes, com
denúncias de entidades contra supostos casos de execução e tortura, o que foi
negado pela Secretaria da Segurança.
o Fórum Brasileiro de Segurança Pública cobrou
medidas para proteger os policiais. “O governador de São Paulo precisa revisar
com os comandos das polícias paulistas sua política de segurança pública e
fortalecer, de fato, os mecanismos de proteção dos mais 100 mil profissionais
que atuam para garantir a segurança da população paulista”, diz a entidade.
“É evidente que o assassinato de um policial
exige reposta dura por parte do Estado, mas isso, em grande medida, decorre de
investigação pela Polícia Civil, a quem cabe investigar e reunir o máximo de
provas possíveis para prender os responsáveis”, afirma Samira Bueno, diretora
executiva do Fórum. “A grande questão é que a gestão (do secretário da
Segurança, Guilherme) Derrite, até por ter sido da Rota e capitão da Polícia
Militar, é muito influenciada pela trajetória dele enquanto policial”, afirma
Samira. “E fica muito nessa ideia de usar o policiamento ostensivo para
resolver todos os problemas, em uma lógica de enfrentamento que acaba gerando
mortes e vítimas para todos os lados.”
Mesmo com essa ideia na nova gestão de
confronto, matar o que fere os nossos, no último mês, dois agentes da Rota
envolvidos na ação se tornaram réus por homicídio duplamente qualificado após a
Justiça receber denúncia oferecida pelo Ministério Público. Eles são acusados
de tampar suas câmeras corporais e plantar uma arma de fogo para forjar um
confronto na Vila Zilda, no Guarujá. “Operações que são pautadas pela ideia de
que o policial vai para a rua para matar ou para morrer vulnerabilizam o
policial. Ele fica muito exposto ao risco e esse ciclo de vingança”, disse
Samira. Ela relembra que, no ano passado, após a morte do soldado Reis, uma
policial militar levou um tiro de fuzil nas costas em Santos. Em outra
ocorrência, uma viatura foi baleada em Caraguatatuba, no litoral norte. Tudo
isso traz a ideia de que a segurança precisa evoluir, precisa de inteligência,
salário de qualidade e acima de tudo à valorização do seu policial, não adianta
“atiçar” nosso policial entrar em confronto, a matar e deixar eles sentados
sozinhos nos bancos dos réus. A Segurança não é mais o velho oeste, ela precisa
evoluir e entender sobre seu papel no século XXI.
* Diretor da Divisão
de Estudos e Monitoramento da Coordenadoria da Atividade
Delegada – Secretaria
de Governo Municipal da Cidade de São Paulo
Formado em Gestão de
Políticas Públicas pela USP
Mestre em Gestão e
Desenvolvimento Regional
Professor de Cursinho pré-vestibular
em São Paulo
Contato:
italocmantovani@gmail.com
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