segunda-feira, 18 de outubro de 2021

MORTES VIOLENTAS POR CAUSA INDETERMINADA


Ítalo do Couto Mantovani*

           

            Até meados de 1990, estatísticas oficiais de criminalidade no país não existiam, um hiato que começa a ser suprido no início do século XXI. E hoje, os dados de criminalidade são de suma importância para todos que querem saber/entender sobre segurança pública. Dados estes, que são transformados em informações e usados habitualmente por países, estados, cidades e organizações para retratar a situação do objeto estudado dentro de segurança pública e criação/aprimoramento de políticas de segurança pública. Com isso, temos certeza sobre a importância em aprimoramento, tanto em nível micro como macro, para divulgação dos dados cada vez mais transparente, seguindo os acordos de Dados Abertos e Governo Aberto assinados no ano de 2001.

            Ao analisar o Atlas da violência 2021, no quesito Mortes Violentas por Causa Indeterminada (MVCI), isto é, um indicador que mensura que não é possível estabelecer a causa básica do óbito, ou a sua motivação, apresenta-se um aumento de 2018 para 2019 no Brasil, 35,2%. A situação é mais grave no Rio de Janeiro, onde as MVCI representaram, em 2019, 34,2% das mortes por causas externas; seguido por São Paulo (19,0%) e Ceará (14,5%). Como falado, apenas de 2018 para 2019, houve no Brasil um crescimento de 35,2% no número de mortes violentas por causas indeterminadas, sendo esse aumento de 232% no Rio de Janeiro, 185% no Acre e 178% em Rondônia. A dimensão do problema também pode ser vista quando se compara as taxas de homicídios e as taxas de MVCI por 100 mil habitantes, que, no Brasil, são respectivamente 21,7 e 7,9. Merecem destaque os casos de São Paulo e do Rio de Janeiro, em que as taxas de MVCI – 9,0 e 28,3 respectivamente – superam as de homicídios – 7,3 e 20,3 – em 23% e 34,4%, respectivamente.

            O crescimento das MVCI afeta as análises realizadas no Atlas. Houve crescimento considerável de MVCI de 2018 para 2019 em variáveis relacionadas a diferentes tópicos do estudo, alcançado 57,4% no caso da juventude. Esse aumento das MCVI, juntamente com a melhoria dos dados produzidos pelas secretarias de segurança pública na última década, fez com que, pela primeira vez, as mortes violentas por causas intencionais (47.742) (FBSP, 2021) superassem os homicídios calculados a partir do SIM (45.503). Um maior número de registros pelos órgãos de segurança pública ocorreu em 9 UFs. No Rio de Janeiro, os dados de homicídios do SIM são 40,6% menores que os registros de mortes violentas intencionais dos órgãos de segurança pública, e em São Paulo, 17,5%.

            O Estado de SP identificou uma queda de 3%. Contudo, ao analisar esse indicador, MVCI, com o número de homicídios dolosos em São Paulo, há um crescimento, desde 2013, de mortes violentas por causa indeterminada e a partir de 2017 esse indicador é superior ao número de vítimas de homicídios dolosos.

            O questionamento que surge, para qualquer pessoa, é de que há realmente uma queda no número de homicídios dolosos no estado? Uma vez que, para o Professor Cerqueira, aproximadamente 74% das MVCI registradas no Brasil (de 1996 até 2010) eram homicídios ocultos. Essa imprecisão pode afetar toda percepção de segurança, invalidar estudos e colocar em xeque políticas públicas que mostram resultados positivos na Segurança Pública.

            Em suma, o crescimento das mortes violentas por causa indeterminada dificulta uma melhor compreensão da evolução da violência letal no Brasil. Pela dimensão desse crescimento, não está invalidada, por exemplo, a conclusão de que houve uma queda da taxa de homicídios no Brasil em 2019, mas reduz-se a precisão da magnitude dessa diminuição. Além disso, os homicídios não computados também podem afetar os resultados de outras variáveis, reduzindo o nível de confiança das análises sobre juventude, homens e mulheres, negros e não negros, pessoas indígenas e homicídios por armas de fogo.

 

v    Assessor de Coordenador na Secretaria da Segurança Pública do Estado de SP

Formado em Gestão de Políticas Públicas pela USP

Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional

Professor de Cursinho pré-vestibular em São Paulo

Contato: italocmantovani@gmail.com

 

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