quarta-feira, 29 de junho de 2022

A POLÍCIA CIVIL E A VALORIZAÇÃO HUMANA


 


Ítalo do Couto Mantovani*

 

            O déficit na Polícia Civil de São Paulo ultrapassou a barreira de 15 mil policiais pela primeira vez desde que o levantamento mensal começou a ser realizado pelo Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp), em outubro de 2017. Atingindo o nível mais baixo de sua história em um momento em que o estado convive com ações deflagradas pelo crime organizado por todo o interior paulista.

            Para conter essa escassez, no final do primeiro trimestre de 2022, a Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo anunciou um pacote de medidas para o avanço e fortalecimento da investigação no Estado. Nesse pacote encontra-se o boletim de ocorrência (BO) unificado, inteligência artificial para identificação de padrões nas investigações, sistema de câmeras e gravação de depoimentos prestados à Polícia Civil, mecanismos de atendimento a distância para casos de violência doméstica e de alguns outros crimes e a possibilidade de aferição do índice de esclarecimento de crimes por unidade da Polícia Civil. Mudanças que vêm em um momento oportuno não só para a Instituição, mas como para a população. São avanços necessários ao aprimoramento da segurança no estado, com à transparência no papel que a Polícia Civil tem em nossa Segurança Pública.

            Esse pacote visa contribuir para melhoria na qualidade de investigação dos crimes como um todo. O BO único é um grande avanço e pode otimizar o trabalho das duas polícias, liberando efetivo da Polícia Militar para outras atividades, mas também aproveitando o trabalho realizado pela PM no registro de ocorrências. O avanço que merece um destaque e também uma ressalva é a possibilidade de correção e de atualização das informações no próprio BO, tornando mais racional o sistema que, antes, uma vez que era composto por BOs complementares, dificultando o entendimento inicial sobre a ocorrência. No entanto, é fundamental que exista um controle efetivo sobre quem fez e quais mudanças foram feitas, para evitar alterações indevidas nos registros. A implantação de câmeras com a consequente gravação dos depoimentos nas delegacias também sinaliza uma mudança positiva. Mas, como já aprendemos com a experiência de implantação em outras polícias, sem estabelecer um protocolo de uso (por exemplo, quem liga, desliga e em quais situações, como serão armazenadas as imagens, e, principalmente, quais os encaminhamentos no caso de as câmeras flagrarem situações indesejadas), a chance de problemas é real.

            Por fim, não menos importante é a meta de aumentar a possibilidade de atendimento aos casos de violência doméstica, em contexto global de aumento desse tipo de ocorrência, especialmente no pós-pandemia, é essencial. É interessante o mecanismo de oferecer uma sala especial para que mulheres possam narrar os fatos para uma equipe especializada de plantão online. Salientam que nunca é simples relatar o caso de violência doméstica, especialmente para as próprias instituições de segurança, pois, muitas vezes, a vítima é desacreditada, acaba sendo incentivada a não fazer o registro ou é revitimizada.

            Mesmo com esse alto empenho no desenvolvimento de ferramentas e aparelhos para o fortalecimento da Instituição, o recurso humano é primordial para o não sucateamento. Esse sucateamento pode levar ao colapso, entre os delegados, dos 4.463 cargos existentes, apenas 2.549 estão ocupados. E em números absolutos, a carreira onde faltam mais profissionais é a de investigador, com déficit de 3.648 postos. Precisamos valorizar nossos colaboradores e o serviço prestado ao cidadão. População fica desprotegida, crimes que poderiam ser evitados começam a crescer nos municípios pequenos, causados pelo crime organizado, conhecidos como “novo cangaço”. A percepção de insegurança aumenta e nossas instituições são cobradas e bombardeadas por decisões feitas de maneiras confusas por gestores sem compreensão do real problema.   

 

 

v    Assessor de Coordenador na Secretaria da Segurança Pública do Estado de SP

Formado em Gestão de Políticas Públicas pela USP

Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional

Professor de Cursinho pré-vestibular em São Paulo

Contato: italocmantovani@gmail.com

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário