terça-feira, 16 de julho de 2019

A SEGURANÇA PÚBLICA BRASILEIRA PÓS GOVERNO MILITAR



Com a redemocratização política em 1985, e a nova Constituição Federal de 1988, o Brasil começa a restabelecer uma sociedade de soberania popular, buscando mudanças não só nas áreas da educação e saúde, mas também em segurança pública. Segundo Sergio Adorno apesar de grandes avanços nesta área, traços de uma sociedade que viveu por mais de 20 anos em um regime autoritário, revelam-se resistentes às mudanças em direção ao Estado Democrático de Direito.
O Regime Civil Militar (1964-1985) altera completamente o caminho político que o Brasil estava tomando no campo social. Isto é, após vários movimentos de expulsão da classe política brasileira, nas décadas de 1930, 1945 e 1954, desta vez os militares assumem o poder, dão início a um governo baseado na repressão política, luta armada, violação de direitos e a censura. O terror como política de Estado foi recorrido a uma estrutura legislativa bem planejada e construída para dar apoio e sustentação ao Regime. Estrutura que se materializa na forma de publicação de Atos Institucionais (AI). Ao todo, o Brasil apresentou 17 Atos, mas o AI-5, editado em 1968, virou o mais polêmico e violento. Suspendendo o princípio de habeas corpus e constituindo de forma clara e objetiva, a tortura e a violência contra todos os opositores ao Regim.
Para  Amartya Sen “o desafio político para os povos de todo mundo atualmente não é apenas substituir regimes autoritários por democráticos. É, além disso, fazer a democracia funcionar para as pessoas comuns”.  Foi somente no final da década de 1970, com uma inflação incontrolável, salários desvalorizados e uma grande concentração de renda que o Regime começa a apresentar sinais de fracasso. Prova desse enfraquecimento não veio só com as greves operárias em 1978- 1980 no ABC Paulista, a criação do Partido dos Trabalhadores em 1979 e o nascimento da central Sindical CUT em 1983, mas também com políticas adotadas por Ernesto Geisel, a partir de 1974, dando uma abertura lenta, gradual e segura ao sistema político brasileiro. Assim sendo, em 1985 chega ao fim o período mais autoritário que o Brasil já vivenciou. Este enfraquecimento não deixou os militares sem controle político, pois sua saída do poder foi totalmente negociada com os sucessores. Prova deste poder é encontrada também na lei de Anistia, de 1979, estabelecendo que nenhum militar seria julgado por “supostos” abusos de direitos humanos entre os anos de 1964 até 1985.
Mesmo o Regime tendo acabado em 1985, só em 1988 que uma nova Constituição foi promulgada. No entanto, as cláusulas relacionadas com as forças armadas, polícias militares estaduais, sistema judiciário militar, a Lei de Segurança Nacional (LSN), o Decreto estipulando que os serviços reservados as polícias militares façam parte do sistema de informação do Exército e de segurança pública em geral continuam praticamente semelhantes à Constituição Autoritária de 1967 e sua emenda de 1969. Por outro lado, o racismo e a tortura, tornam-se crimes inafiançáveis e imprescritíveis, atribui-se também a autonomia ao Ministério Público e assistência judiciária aos sem recursos suficientes para defesa, ficando cada evidente que a Constituição proporcionou a sociedade instrumentos de defesa contra o poder do Estado.
Deste modo, o primeiro presidente que começa a discutir mudanças estruturais no plano de Segurança Pública Brasileira é o então, Fernando Henrique Cardoso em 1996, isto é, há uma lacuna de aproximadamente 10 anos. Após a Conferência Mundial de Direitos Humanos em Viana, no ano de 1993, o Brasil institui o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), criando a Secretaria de Planejamento de Ações Nacionais de Segurança Pública (Seplanseg) em 1995, dentro da Pasta do Ministério da Justiça. E modificando-a para Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) em 1998. Caracterizada por assessorar o Ministério da Justiça na definição e implementação da política nacional de segurança pública; acompanhando também as atividades de órgãos do mesmo interesse. Essa articulação entre as unidades federativas do Brasil se estrutura na ideia de um Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), fundamentado no Sistema Único de Saúde (SUS). Um sistema que não busca a unificação dos Estados, pois cada Estado tem uma dinâmica de segurança pública muito diferente, além de reconhecer a autonomia das instituições que a compõem. Mas busca a integração e otimização dos resultados, de modo facilitador para atividades de segurança pública. Deste uma troca de informações até o aperfeiçoamento de planejamento de atividades.
Vale ressaltar que desde 2003 a Senasp trabalha para implementação do SUSP, mas foi no dia 11 de junho de 2018, no governo do então Presidente Michel Temer que a lei 13.675 do mesmo ano, foi sancionada. Criando assim, um Sistema Único de Segurança Pública. Ainda no Governo de Fernando Henrique Cardoso, mas no seu segundo mandato (1998-2002) aprimora-se o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) criando o Plano Nacional para Segurança Pública.
Ao longo da história brasileira de segurança pública caso com o do sequestro do ônibus 174 só agravaram a imagem de um país que busca políticas públicas de segurança pautadas na repressão e na diminuição de criminalidade, sem bases sustentáveis para aplicação de uma política pública de qualidade. Deste modo, a questão de segurança pública atrelada aos altos índices de criminalidade, se tornou grande parte das discussões políticas brasileiras, transformando-se em assuntos de enorme preocupação não só por parte da população, mas também dos governantes e da comunidade científica, em função disso.
Nesses últimos 15 anos, o Ministério da Justiça ainda criou o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), apresentando uma característica até então inédita no país. Um projeto que articula políticas de segurança com ações sociais, priorizando a prevenção. Em 2004 criou a Força Nacional de Segurança Pública, uma modernização das instituições de segurança pública, que só em 2004 apresentou mais de 7,8 mil homens e mulheres de elite da polícia militar e do corpo de bombeiro de todo o país. O Pronasci que realizou a campanha do desarmamento, recolhendo milhares de armas em todo território e pagando uma indenização, com base no artigo 31 da lei 10.826/03. Simplificando, acredita-se que o governo federal investiu até 2012 cerca de R$ 6,7 bilhões de reais, beneficiando direta ou indiretamente 3,5 milhões de pessoas, entre profissionais de segurança pública, jovens e suas famílias. No ano de 2018 foi criado o Ministério da Segurança Pública, devido ao caos instaurado na cidade do Rio de Janeiro e por meio de uma medida provisória, os meios para este ministério são direcionados dos recursos arrecadados pelas lotéricas federais.
Uma quantia de investimento que não é suficiente ou não está sendo aplicado de forma correta para a segurança pública no Brasil. É o que mostra alguns dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2017. O país teve em 2016 7 pessoas assassinadas por hora; as mortes violentas intencionais marcaram no mesmo ano 61.283, isto é, o maior número já registrado no Brasil, com um crescimento de 4% em relação ao ano de 2015. O país também ocupa a posição de país que mais mata policiais civis e militares. Em 2016 os números de policiais vítimas de homicídios foram de 453.  Esses dados correspondem ao crime contra a vida, mas contra o patrimônio não é singular. O Brasil teve 1 carro roubado por minuto em 2016, e entre 2015 e 2016 esse montante chegou a casa de 1.066.674 veículos.
Em meio a este cenário de tantas incertezas, crimes e desigualdades sociais, a violência vem ganhando espaço e ceifando vidas de centenas de pessoas mais carentes e necessitadas. O poder público por falta de conhecimento ou até mesmo omissão deixa o assunto sempre para segundo plano e prejudicando a vida de muitos brasileiros. Atualmente, muitas informações sobre segurança pública podem ser consultadas em portais de segurança, sites de organizações não governamentais e até mesmo em blog de especialistas ou não da área de segurança, mas o país ainda está longe e ter ferramentas em tempo integral para o cidadão que se preocupa com sua segurança.


Assessor Técnico na Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo
Formado em Gestão de Políticas Públicas Pela USP
Mestrando em Gestão e Desenvolvimento Regional
Professor do Cursinho Popular em São Paulo
Contatos: italo.mantovani@usp.br


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